sábado, 14 de novembro de 2009

Não se queixe. Tá rindo do quê?

Os amigos de sempre me falam que eu tenho vida boa, uma família que me ama, um bom emprego e sou saudável.
Qualquer um que me veja pegando o taxi, indo pra academia ou ao salão pensa logo: que vida boa a dessa menina, com família legal, empregão e saúde. Que saúde, hein?
É isso aí mesmo que eu sou. Pra quem me olha de fora. E isso me enche de culpa.
Eu amo minha família e isso me deixa ainda mais triste, porque por maior que seja meu amor por eles e deles por mim, não é amor suficiente pra me fazer feliz. No entanto, pra muita gente era só isso que faltava pra ser feliz pra cacete.
Quando tenho de tratar com o marceneiro, com o mecânico ou com o cara que instala prateleiras, sinto vontade de alguém pra me ajudar e isso aumenta o vazio que vive aqui no meu peito. A prateleira ficou mais alta do que eu queria e eu fiquei puta comigo mesma, que não sabe nem viver sozinha e muito menos em comunidade.
A vizinha que fala sozinha me deprime e me irrita ao mesmo tempo: tem cheiro de xixi e tem mania de vir falar comigo logo de manhã. Quando eu sinto raiva dela por isso, me sinto a maior filha da puta sem coração do mundo, porque ela é velhinha e eu deveria relevar o cheiro de xixi, mas de manhã não dá. O porteiro com uma perna mais curta também me deprime e eu nem sei o nome dele. A vizinha que implica com o som da minha TV, com meu cigarro, com meu incenso me desperta uma vontade de mandar todo mundo que me irrita tomar no cu. Começando por ela. Eu queria ter coragem de mandá-la tomar no cu e fumar todos os cigarros do mundo na janela, só pra foder com a paciência dela, que ia ter um medo fodido de mim. E eu ia dormir na boa, sem precisar de Rivotril, porque eu ia sempre externar minhas raivas e não ia precisar de Rivotril nunca mais. Mas eu não me lembro da última vez que dormi a noite inteira. Por maior que seja meu sono, minha tristeza é maior e me acorda sempre gritando "vai tentar dormir pra me esquecer? Não vai conseguir!".
E então eu pego um livro, que só serve pra me lembrar que leio mais por pra fugir da tristeza do que por gostar de ler. E me lembro que nunca vou ler os livros todos que eu gostaria e fico pior do que já estava.
Por isso levanto e vou trabalhar. Vamos trabalhar: eu e minha tristeza nos levantamos juntas da cama e juntas permanecemos o dia inteiro. E eu torço pro final de semana chegar pra visitar meus pais, mas a tristeza sabe o caminho de lá também.
E aí me chamam de esnobe, de fria ou sei lá do quê mais. Só porque eu não quero ninguém dando palpite na minha vida, me lembrando de como minha família me ama e isso deveria bastar. De como eu tenho um excelente emprego e isso deveria bastar. De como, puta que pariu, falam de tudo o que eles acham que eu tenho, mas ninguém entenderia que nada disso me basta. E eu faço cara de esnobe. Eu pago o jantar. Eu levo o vinho mais caro. Eu convido, eu pago. Porque eu sou esnobe pra cacete. Porque sendo assim eu não sou só triste. Sou triste e esnobe, com muros altos e janelas blindadas. Tudo isso porque eu queria um pouco do seu carinho e não ganhei. Tudo isso porque a porra do show foi ótimo mas você não quis ir comigo e por isso nem prestei atenção. Você não tem tempo pra mim. Mas tem tempo pro resto do mundo, mas é muito educado pra dizer que eu não faço parte do seu mundo.
E coitado do amigo que me falar que sou ingrata com a vida, porque a vida me deu tudo e eu pago como? Com essa cara de quem não tá nem aí, essa cara esnobe de quem não percebe como a vida faz um sacrifício imenso pra ser maneira comigo: me livra de acidentes, de tragédias, me consegue só emprego legal, mas como eu retribuo essa generosidade? Com palavras secas e falta de perspectiva. Digo que não acredito em amor eterno, que casamento é o fim. Que nunca tive vontade de ter filhos. Puta mal agradecida que eu sou. A vida me dá tudo, eu é que não vejo.
Não vejo porque minha tristeza, que é do tamanho da minha vida, fica na frente, faz sombra pra tudo o que eu tenho.
E todas as vezes que eu penso que você cabe direitinho no meu mundo mas você não tem nem tempo de me telefonar, toda vez que eu penso nisso eu quero morrer de novo. Mais uma vez, dentre tantas vezes que já morri. E se eu já morri, eu também já nasci de novo. E sempre que nasci pensei que ia ser diferente, mas continua tudo a mesma merda. A tristeza nasceu comigo, me ocupa a alma, qualquer espaço em mim. Mesmo quando eu penso que tô um pouco feliz, olho pro lado e vejo que a tristeza foi ali e volta já.
E meu amigo vai me encher o saco pra eu não falar que já morri, porque isso é ser muito ingrata e muita exposição. E eu tento, de novo, explicar que não preciso de bala perdida pra me sentir morta. Eu me sinto morta toda vez que alguém deixa de me amar. Ou se esquece do meu aniversário, ou não me convida pra passear no calçadão.
E falar isso faz meu amigo e todo mundo achar que sou dramática, mas eu falo assim mesmo, mesmo sem ser dramática e odiar que pensem que sou.
Pra falar a verdade, minha vida não é uma merda, mas eu sinto um cheiro ruim de qualquer jeito.
Então continuo jantando em lugar caro, bebendo vinho bom e ganhando bem. Porque só o esnobismo me salva de querer ser a coitadinha dessa história chata que é a minha vida.

4 comentários:

  1. Aline, Bom Fim de Semana! (realmente é o que eu desejo)
    Eu tenho acompanhado o seu blog tem mais ou menos um mês, e a sensação que eu tenho quando leio o seu blog é um aperto no peito, um nó na garganta, dói. Sinceramente não sei por que eu volto no dia seguinte sabendo que vou sentir tudo isso novamente, mas eu volto!
    Me dá uma vontade de te pegar no colo ou te dar a mão na hora de dormir, como se isso fosse resolver a sua tristeza. Não estou te julgando, mas acho incrível alguém não ver o lado bom da vida. As coisas pequenas é que me fazem feliz!
    Beijos, Ju.

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  2. Aline
    Eu não sinto aperto ao te ler. Porque algum dia a gente sente da forma que está. Não tudo de uma vez, mas a gente sente.
    Qundo estou em Santo Antonio do Amparo e a casa parece que vai cair, porque o unico homem que faz calha não apareceu e a chuva está quase derrubando a parede e os meus irmãos cobrando.
    Eu penso. Porque não tem um PAU para me ajudar?
    Depois quando chega a noite e resolvo sair. Todas tem um acompanhante . Eu não.
    Aí eu penso. Cadê o meu PAU?
    E para dormir sozinha. Eu tenho a Tonha que não fede xixi, mas cobra que eu não converso com ela. Eu chegava exausta e queria era ver televisão.
    Aí eu pensava. Porque não tenho um PAU?
    Mas no fim eu começo é a rir. Que me importa a casa, a saida a noite, o dormir sozinha, o ficar sem os irmãos e a mãe. O dormir com a babá de 80 anos.
    Tudo passa e breve, como agora, estou com saudades dos meus dias de tristeza em Santo Antônio do Amparo.
    Hoje eu optei por ficar com mamae e Andrea aqui.
    Mas vou te dizer: Eu adoro ficar sozinha, caladinha.Sem fazer nada, só.
    Mas isso não quer dizer que estou achando ruim aqui, não.
    Mas conviver é muitas vezes sinonimo de doação.
    E as vezes a gente quer ser é egoista mesmo.
    Quem explica?
    Eu não.
    Com carinho Monica

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  3. Juliana,
    achei tao legal vc não concordar com meu modo de ver a vida e ao mesmo tempo dizer que tem vontade de segurar na minha mao na hora de eu dormir, pra ver se minha tristeza passa... Que fofo. Sabe que qdo quero mostrar pra alguém que estou ao lado dela, eu faço exatamente isso: seguro a mão da pessoa.
    Minha irmã fala: oba! segurou minha mão, isso quer dizer que não to sozinha!
    Beijo carinhoso

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  4. Olha, Olha! Onde tudo começou!
    Tenho uma boa notícia, hoje lhe entendo mais. Porém continuo querendo lhe dar a mão.

    Beijão, Ju.

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