sábado, 12 de agosto de 2017

DIA DOS PAIS SEM MEU PAI

Amanhã será meu terceiro Dia dos Pais sem meu pai. Não que fizéssemos questão de comemorar essas datas – Natal, aniversário ou mesmo o segundo domingo de agosto juntos... Nossa união era maior do que datas. Éramos amáveis um com o outro o ano inteiro. Mesmo assim, sem termos o hábito de ritualizar esta data, não será um dia fácil para mim.
   Estes dois anos e cinco meses sem meu pai têm sido difíceis e, ao que tudo indica, haverá ainda muito tempo pela frente para eu me recuperar desta perda.
   Perder meu pai foi, sem dúvida, a coisa mais difícil que já me aconteceu. Chega me dar saudade dos antigos problemas que enfrentei: separações, perda de emprego... Todas as outras situações que, na época, pareciam incrivelmente difíceis perderam o peso. Viver sem meu pai é tão maior do que tudo.
   Sempre fui a “filhinha do papai”, mesmo adulta eu tinha meu paizinho ali, com seu abraço, seu colo, seu zelo. Aquele 10 de março de 2015 me tirou tudo isso e me transformou em adulta. Eu não estava pronta para deixar o colo do meu pai e me deparar com a vida de “gente grande”.    
   Ainda tenho dificuldade em viver num mundo onde meu pai não existe. Eu, que sou feita de Cléber e ossos, de Cléber e células, de Cléber e sentimentos, eu que era inteira por tê-lo por perto, acho muito estranho não o ter comigo.   
   Eu e meu pai sempre fomos inseparáveis, unidos mesmo. Falávamos a mesma língua, gostávamos das mesmas coisas. Havia entre nós dois um algo a mais, uma espécie de adoração mútua: ele era meu ídolo e meu fã. Meu pai e meu filho.
   Dizem que ele tinha alguns defeitos. Mas eu não os enxergava. Só via nele coisas boas, gostava de tudo nele. E “ai” de quem falasse algo negativo sobre ele. Eu me descontrolava mesmo. Uma vez, eu tinha uns 10 anos, briguei (briga física mesmo) com meu primo Alberto na frente da Igreja da Matriz. Motivo? Alberto falou que meu pai era careca! Achei o fim e parti pra cima dele. Onde já se viu falar que meu pai era careca...      
   Vou falar uma coisa bem íntima, que já me passou pela cabeça algumas vezes desde que ele se foi: eu gostaria que ele não tivesse sido tão bom comigo. Sei lá, desejei por vezes que ele fosse  menos carinhoso, um pouco mais ausente. Quem sabe assim eu não sentiria menos sua falta? Mas não, ele foi um pai excepcional. Eram tão bonitinhas as coisas que ele fazia por mim, tipo, comprar livros e mais livros porque eu gostava de ler e se orgulhar por me ver lendo. Ou me ensinar a andar de moto porque achava lindo mulher pilotando. Quando eu usava um vestido comprido, ele dizia que estava linda e falava isso de um jeito tão cheio de orgulho que era fofo demais.
Ah! Teve também o dia que um namorado pediu minha mão em casamento e ele se levantou da mesa e se trancou no quarto. Não deu resposta. Todos acharam aquilo uma grosseria, eu achei lindo.
   Ele arrumava minha cama, fazia meu Nescau de manhã e nunca deixava faltar nem Coca Zero e nem leite desnatado. Eu também cuidava dele. Muito. Fosse mandando cartõezinhos do tipo “eu te amo”, fosse procurando por um tratamento para seu problema de vista. A gente se curtia e se cuidava.
   A vida do meu pai andava muito difícil nos últimos anos: perdeu a mãe, dois irmãos (como ele era apaixonado pelos irmãos. Todos os quatro!), perdia a visão aos poucos... Ele tinha tanto medo de ficar cego! Sorria cada vez menos. Mas nós (eu, minha mãe, minha irmã, meu cunhado, minhas sobrinhas e a tia Hélcia – sua irmã caçulinha) nunca deixamos de dar nosso amor a ele. 
     Aliás, era tão fácil amar aquele cara: bastava conhecê-lo um pouco, passar 15 minutos em sua companhia e qualquer um sacava sua alma de criança, seu coração puro.   
   O último Dia dos Pais que passamos juntos foi bem triste: foi o sepultamento de seu irmão mais novo. E ele parecia ter morrido um pouco naquele dia. Almoçamos em um silêncio eloquente e ele entendeu tudo o que eu não disse sobre meu amor por ele.
   Eu não tive apenas um pai, tive um amigo, um filhinho, o maior fã. Ele sempre será o amor da minha vida. Não importa em qual dimensão esteja. 
   Amanhã eu ligaria para ele, falaria o quanto sou feliz por ter um pai tão especial. Igual fazia três, quatro vezes por semana, o ano todo. E ao desligar o telefone, sentiria um amor tão forte que me faria olhar para os céus e agradecer por conhecer aquele sentimento bonito, forte, incondicional.
   Este mesmo amor continua existindo aqui dentro de mim. Já cheguei a perguntar a meu Mestre se é normal continuar amando alguém que não está mais aqui. Ouvi que sim, que amor não depende de o outro estar presente, da expectativa de estar próximo ao ser amado. Amor existe e pronto. E quando é amor de verdade, ele pode até dar uma dor no peito, mas sobretudo, ele nos dá paz.  
    E quando penso no meu pai, eu sinto isso: uma paz imensa... Minhas lembranças dele são cheias de paz, de serenidade. Talvez pela certeza de que cumprimos nossa missão aqui na Terra de sermos pai e filha “de verdade”. E também porque eu sei que sua ausência é somente física. E que sua alma, sua essência, está em algum outro lugar evoluindo espiritualmente. E acredito também que, de vez em quando, ele se faça presente e olhe por mim.  
    Amanhã é certo que eu fique meio encolhidinha no meu canto. Quase aposto que algumas lágrimas vão descer. Mas vou certamente lembrar que fui uma das poucas felizardas que soube celebrar a sorte que é ter um pai de verdade. E vou agradecer a D´us por ter me dado meu Cléber, meu Tataio, como pai aqui na Terra.
    E, como eu disse outro dia: o cidadão Cléber de Oliveira Mello morreu, tem até atestado de óbito. Mas o meu pai, ah, o meu pai estará sempre vivo em mim. A cada vez que eu me olhar no espelho, ele estará lá nos meus olhos pequenos, no sorriso com os dentes grandes, no formato do rosto. Ele estará sem vivo enquanto eu viver. Vivo em meu coração e no meu rosto que, orgulhosamente, tenho parecido com o dele.


Meu Tataio amado, lindo, especial, Meu,
  

domingo, 2 de julho de 2017

Otimismo x Esperança - Rubens Alves



"Hoje não há razões para otimismo. Hoje só é possível ter esperança.
Esperança é o oposto de otimismo.
Otimismo é quando, sendo primavera do lado de fora, nasce a primavera do lado de dentro.
Esperança é quando, sendo seca absoluta do lado de fora, continuam as fontes a borbulhar dentro do coração.
Camus sabia o que era esperança. Suas palavras: e no meio do inverno eu descobri um verão invencível...
Otimismo é alegria por causa de: coisa humana, natural.
Esperança é alegria a despeito de: coisa divina.
O otimismo tem suas raízes no tempo. A esperança tem suas raízes na eternidade.
O otimismo se alimenta de grandes coisas. Sem elas, ele morre.
A esperança se alimenta de pequenas coisas. Nas pequenas coisas ela floresce. Basta-lhe um morango à beira do abismo.
Hoje, é tudo o que temos (...): morangos à beira do abismo, alegria sem razões. A possibilidade da esperança..."

Trecho da crônica o Otimismo e a esperança, de Rubens Alves, publicado no livro Conserto Para Corpo e Alma.
Leia mais sobre o autor aqui

sexta-feira, 10 de março de 2017

Dois anos sem você

    Hoje faz dois anos que a vida te levou. Dois anos que nossa família passou pela maior dor que jamais podíamos imaginar. Dois anos de muitas lágrimas. Dois anos sem você.
    Até então, eu era sua filhinha, mas um telefonema me transformou em adulta e todos os desgostos e responsabilidades peculiares caíram em meu colo. E, além de tudo, eu tive de aprender a viver sem você. Logo eu, que sempre achei isso impossível: como viver num mundo onde você não existe, pai? 
    Às vezes, acho que isso não é verdade e vou encontrar você ali, deitado na cama, ouvindo seu radinho. Ou você vai chegar aqui em casa dizendo que comprou minha Coca Zero. Mas nada disso vai acontecer. Não vamos mais nos abraçar, assistir o Mengão jogar ou ouvir nossas músicas juntos. Agora eu sou adulta e não tenho mais meu paizinho. Como na canção do Roberto, "sem você minha alegria é triste". Por isso essas lágrimas no rosto de vez em quando. Não fique triste quando isso acontecer. Deve ser o amor transbordando. 
    A gente era uma boa dupla, né? Você me dava sentido à vida e eu te fazia sorrir. Mesmo em meio às suas tristezas, eu te fazia sorrir. E saber disso me fazia grande, importante. Eu era especial para você. 
    E você era meu pai, meu amigo, meu filhinho, meu ídolo. Você sempre será o amor da minha vida. Não importa em qual dimensão esteja. 
    Pai, embora dizer adeus para você tenha sido a coisa mais triste do mundo, eu sabia que fui a melhor filha do mundo, a filha sob medida pra você. Diante de seu corpo eu cantei nossa música, prometi que ia cuidar de seus amados aqui na Terra e jurei que ia continuar sendo aquela mulher forte que você sempre admirou. Sobretudo, diante de seu corpo, eu tive a certeza de que nunca deixei para depois o carinho, o beijo, o abraço. Nunca deixei de dizer e demonstrar o quanto te amo. Eu me despedi de você com o coração limpo.     
   Nestes dois anos sem você aqui, eu tive de ser muito forte, mas muito forte mesmo. Você deve acompanhar daí de cima as minhas lutas e deve se orgulhar. Porque, por mais que a dor seja lancinante, estou lutando. Então, mais uma vez, eu peço: não fique triste quando eu chorar. 
   Continue sua caminhada nesta sua nova condição. Continue sua evolução espiritual. Mas, sempre que der, olha pra mim aqui. E promete que vamos nos reencontrar na próxima vida, porque que nosso amor é grande demais para uma única existência.     
            
     
PS: Dentre tantas canções que me lembram de você, essa é uma. Você não conhecia, sequer escutamos juntos. Mas ela fala muito sobre mim sem você.

" Eu tento me erguer às próprias custas
  E caio sempre em seus braços
  Um pobre diabo é o que sou
  Um girassol sem sol
  Um navio sem direção
  Apenas a lembrança do seu sermão

  Você é meu sol, um metro e sessenta e cinco de sol
  E quase o ano inteiro os dias foram noites
  Noites para mim
  Meu sorriso se foi
  Minha canção também
  E eu jurei por Deus não morrer por amor
  E continuar a viver
  Como eu sou um girassol, você é meu sol  (...)


  Morro de amor e vivo por aí
  Nenhum santo tem pena de mim
  Sou agora um frágil cristal
  Um pobre diabo que não sabe esquecer
  Como eu sou um girassol, você é meu sol "

terça-feira, 28 de fevereiro de 2017

Não sou feliz gorda

Comecei a engordar com 10/ 11 anos e até os 15 anos não parei mais: cheguei aos 76 kg. 

Passei a adolescência sendo a “gordinha legal”, engraçada, simpática... Nunca fui chamada de bonita. Todo minha família me repreendia por ser gorda. Eram palavras ou “simples” olhares, que magoavam tanto ou mais que as palavras.


Não tenho fotos desta época: fugia das câmeras e, no fundo, acho que ninguém percebia minha ausência nas fotos. 

Bem, este pensamento é fruto da minha auto-estima baixíssima, provocada por eu ser gorda. E quanto mais gorda, menos auto-estima; quanto menos auto-estima, mais gorda. Bola de neve total


Apesar de ter um rosto bonito, tinha uma espécie de “capa” me cobrindo. A gordura me recobria e me deformava. Para disfarçar minha impotência (impotência: é esse meu sentimento por ser gorda), tentava me convencer de que era bonita mesmo sendo gorda. 

Durante o tempo que tentei me convencer de que podia ser feliz do jeito que era, travei uma espécie de luta contra todos o mundo: tornei-me agressiva e arredia. Se alguém tocasse no assunto dieta, eu dava logo um fora e fingia que não tinha vontade de emagrecer. 

Na família do meu pai havia muitos gordinhos e gordões. Mas a família de minha mãe (minhas tias e primos)eram todos magros. Para mim, afrontadoramente magros

Definitivamente não é fácil ser gorda quando se tem tantos primos “normais”. Se uma ou outra brincadeira acabasse em discussão, era aquele monte de desaforo: “Olívia Palito” para a magricela; “Ferrugem” para a sardenta e para mim o mais cruel de todos os xingamentos (aquele que até hoje ainda arde em meus ouvidos): “GORDA!”, "BALEIA"... 


Durante muito tempo não sabia o motivo para ter começado a engordar. Achava mesmo que foram os maus hábitos aliados a uma herança genética e talvez alguma ansiedade típica da adolescência. Hoje, depois de fazer terapia, sei o que me levou a engordar. É muito pessoal, logo, não vou dividir. 

Mas tenho lembranças dos “sutis” conselhos para comer menos. Uma vez ou outra percebia que alguns parentes se preocupavam/ assustavam com meu peso, mas nunca ninguém tocou direto no assunto do jeito, ao meu ver, correto: sem punição, mas sim para me ajudar. 

Sem querer achar culpados, acho que alguém deveria ter me perguntado “Você está feliz? Posso lhe ajudar?”. A repreensão só aumentava a raiva: de mim, por ser gorda; pelos outros, por não me ajudarem. 

Minha auto-estima foi toda construída (ou destruída) com base no meu peso. 


Aos 15 anos,a mãe de uma grande amiga me levou a um médico que estava “conseguindo emagrecer” um monte de gente na minha cidade. Fui à consulta feliz da vida. Saí de lá confiante. Todos me perguntavam quanto pesava e, pela 1a vez na vida, falei para alguém o meu peso: 74 kg. Mas falei porque sabia que perderia muitos deles.


E perdi mesmo! Em menos de 1 mês já pesava 64 kg. Eu, pela 1a vez na minha vida, era “magra”. Era a primeira vez que usava um biquíni, tomava sol sem vergonha e... podia pegar roupas emprestadas de amigas. Não dá para descrever nada do que senti naqueles dias de descoberta.


Podia, enfim, vestir um short da minha irmã... ai, que delícia!!! Eu era normal, gente, eu era normal! Não precisava usar camisa preta; não precisava usar saia com elástico; não tinha vergonha de comprar roupa: tudo me servia. E ficava lindo.


Passei alguns meses nessa felicidade: mais do que simpática ou inteligente, eu agora era muito GOSTOSA! Pela 1a vez eu era igual às minhas primas. Deus do céu, eu era magra, tinha rapazes me olhando, tinha prazer em sair para comprar roupas... eu era magra! 

Mas foi tudo passageiro: emagreci a base de remédios fortíssimos e (todo mundo conhece esse filme) quando parei de tomar aqueles “remedinhos” é claro que voltei a comer tudo de gostoso.


Mas agora era pior: eu já sabia onde era o céu e não tinha mais a chave daquele paraíso, não podia entrar naquela terra da felicidade onde só os magros moram. 

Em 91, mudei de cidade. Em março procurei outro médico “daqueles” e que receitou outra “bomba”. Emagreci e fiquei pesando 68 kg. Era mais do que já havia pesado na primeira dieta, mas “dava pro gasto”. Passei o ano oscilando entre 67 a 69 kg mas nas férias... relaxei geral: 72/ 74 kg. Passei o ano seguinte infeliz e deprimida, sem conseguir levar dieta alguma em frente. Tinha duas amigas na escola que eram lindas, magras, gostosas,namoradeiras... Eu? Eu era a “amigona” (em todos os sentidos: grande amiga e amiga grande. Enorme. Imensa). 

Passava um ar de séria, desapegada das coisas “fúteis” como ginástica, praia, roupas da moda... Namorados? De jeito nenhum, “às vésperas de prestar Vestibular não dá pra namorar”. Nem gostava de passear. Fotos? continuava a fugir. Não queria registrar aquele horror que eu era. 

Uma ou outra fotografia que tenho naquela época, fui quase que obrigada a tirar. E quando via as fotos, passava a semana deprimida: só o que conseguia ver na frente era aquela imagem horrorosa, deformada pela gordura. Quando falo "depressão" não é aquela tristeza comum a todos, era depressão de verdade, que me paralisava e fazia sofrer.

Se algum amigo me falava que eu precisava emagrecer, ficava com raiva - porque sabia que era verdade. Se diziam que estava “bem”, sentia raiva porque sabia que era mentira. 

Passei mais de dois anos assim: insatisfeita, tentava emagrecer, como não conseguia, sentia nojo de mim. (E essa era a palavra perfeita para descrever o meu sentimento em relação a mim mesma: nojo. É muito triste sentir isso).

Voltei a um dos médicos (na verdade, conheci a maioria dos médicos estilo "Dr. Caveirinha" - famosos ou não - do Rio). Queria emagrecer a todo custo. Na minha cabeça ainda assombrava a velha história de que tudo o que não conseguia, não tinha ou não podia era por causa da gordura. Principalmente os rapazes que não olhavam para mim. E eu dava razão a eles. Eu era imensa! Minha auto-estima diminuía na inversa proporção que engordava e isso me impedia de ser, um pouquinho que fosse, atraente. 

Aos 23 anos, após diversas consultas com endocrinologistas (que constatavam não haver problema hormonal algum), me considerava um caso perdido. Tinha medo de perder minha juventude por causa desse imenso sofrimento. 

Quem nunca teve problema com peso nem sequer imagina o que estou falando, pode até achar que meu sofrimento era futilidade ou exagero. Não dá para saber o constrangimento que sempre passei por ser gorda. É como se eu tivesse constantemente infringindo uma lei, cometendo um erro grave. 

Quando mudei de emprego, resolvi começar (de uma vez por todas) uma nova etapa da minha vida. E a mudança iniciaria por trocar o manequim. Voltei ao médico. Mais “bolas” para conter a gulodice e a ansiedade. Mas eu jurei que era para valer daquela vez. O clima de mudança me animava: ao deixar meu primeiro emprego (de quatro anos) me sentia confiante; cortei o cabelo; aos poucos esquecia um amor não correspondido – que me dava a eterna ideia de ser inadequada. Eu tinha uma enorme certeza de que não merecia ser amada por causa do meu peso. Amada por um homem, por amigos e também pela família.

Dessa vez, focada nas mudanças, foi fácil perder 8 kg. Fiquei fascinada: era de novo GOSTOSA. Palmas para mim. O astral não podia ser melhor. Ainda faltavam muitas conquistas na vida, mas só por saber o meu poder de transformação, minha coragem já crescia. 

Arrumei namorado; terminei namoro; arrumei outro ... Além de estar ótima comigo, fazia sucesso com os outros. Decidi não ir mais ao médico, pois além de ser muito cara a consulta, me achava forte o suficiente para continuar minha jornada sozinha. Eu ainda não entedia como funciona a doença chamada obesidade. Sequer desconfiava que era doente.

Procurei os Vigilantes do peso e emagreci quase 4 kg em 1 mês. UAU: pesava 62 kg! Descobri novamente que tinha um rosto bonito demais para ficar recheado de gordura. “Vai ser fácil manter-me assim”, dizia para mim mesma. Mas aí vem a fase mais difícil: todos estavam acostumados a me ver “gordinha” e quando a viam “magrinha”, diziam que se eu emagrecesse mais ficaria com cara de doente. 

Começaram, então, os deslizes: um sorvete aqui (afinal, “eu estava bem”), uma pizza ali, uma lasagna “só hoje”. Claro que os 62 kg não duraram nem um mês. E eu no Vigilantes? Saí correndo, morrendo de vergonha de não conseguir manter o peso nem por duas semanas. 

Estacionei por uns tempos nos 67 kg. Comecei a namorar um cara maravilhoso e que gostava de mim do jeito que era. Mas EU nunca estava bem comigo. Como pode? Realizei o sonho de toda mulher: encontrar um cara doce, amoroso, paciente e que não sabe a diferença entre estar com 70 ou 60 kg... 

Um dos desastrosos efeitos da baixa auto-estima é depender da aprovação do outro para nos sentir bem e o desconforto de ser gorda por tantos anos fez eu ter uma ideia muito errada de mim mesma. Foi quando descobri que tenho uma doença muito séria chamada obesidade, uma doença cada vez mais presente na vida da população. Essa doença é muito mais séria do que pode parecer: ela deforma, machuca, enlouquece. Exclui. 

Em 2001 concretizei um velho sonho: fiz plástica no abdômen e lipoaspiração (me livrei de 2,5 lt. de gordura). Virei outra pessoa. Emagreci 7 kg e passei a vestir roupas que sempre morri de vontade. Meu manequim diminuiu do 42 (apertado) para 40 (LARGO!). Foi uma transformação gigante.
Mesmo assim, voltei a brigar comigo mesma para não engordar, porque tenho a impressão de que se ganhar 500 gr. estarei assinando o atestado de incompetente. 

Eu me cobro muito, eu sei, mas é assim que vivo. Já fiz terapia e tentei me convencer de que eu não sou só um corpo, sou muito mais. E percebi que nas épocas que estive magra, os problemas continuavam. Estar magra não era certeza de felicidade. Mas é difícil: são anos e anos de sofrimento. Repito:para quem não sabe o que é ser gorda pode parecer loucura isso, mas só quem sofreu ou sofre de obesidade entende.

Há uns 5 anos passei por momentos bem difíceis na vida profissional e pessoal e cheguei aos 77kg. Por mais esforço (dieta e exercício) não conseguia perder 100gr. De tanto tentar e falhar, tentei me convencer de que posso ser bonita gordinha. Mas recentemente na terapia descobri o seguinte: estar magra não me garante estar feliz, mas estar gorda, definitivamente, me deixa infeliz. Infeliz e medrosa, a ponto de sequer conseguir dar em cima de ninguém. Acho que nunca serei correspondida enquanto estiver gorda.

É por isso que continuo lutando contra a balança. E esse é um desafio muito particular, muito íntimo, por ser muito intenso e nem sempre as pessoas à minha volta entendem. Mas estou na luta ainda: pela perda de peso e pelo aumento de minha auto-estima.  

sábado, 25 de fevereiro de 2017

O dia que meu amigo me deu um conselho

Ontem um velho amigo meu me falou "você já percebeu que em meia hora de conversa você já falou sobre mil defeitos seus?". 

De fato, no meio da conversa eu soltava umas frases do tipo "nossa! minha unha tá horrível", "meu cabelo tá sem corte" ou "tenho de voltar a malhar, tô gorda".

Quantas vezes, num dia, a gente não repete essas coisas negativa sobre nós mesmas? A gente fala isso com tanta naturalidade, que nem percebe e, quando vê, esse monte de reclamações já virou uma grande verdade na nossa cabeça.

Respondi pro meu amigo que ele me deu um toque muito importante, pois eu, assim como um monte de mulher que conheço, ando precisando gostar mais de mim. Aí ele, que é meu amigo e gosta de mim, se lembrou de alguns elogios que já me viu recebendo. E que, em quase todas as vezes, fiquei sem jeito, quase como se dissesse "para com isso, eu não mereço ser elogiada". Ele saiu falando "Você tem olhos lindos", "suas pernas arrasam" e por aí foi. Falei que ele deveria estar muito inspirado, mas ele respondeu que estava mesmo é preocupado em ver eu mesma me colocar tão pra baixo e quase todas as vezes por causa de 6/ 7 kg a mais.  

Entendi o quão profundo era aquele toque: afinal, sou mais do que isso, mais do que um corpo, mais do que o que a balança me mostra. 

Acreditei no meu amigo e resolvi repetir para mim mesma, como se fosse um mantra, cada uma dos elogios. E me lembrei de outros: sou inteligente, sou uma boa amiga... Decidi não virar uma chata de galocha.

Pô! Gorda de cabelo sem corte e ainda por cima chata?