quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Superação é o cacete

Aconteceu um episódio comigo que me fez (re) pensar a vida e nas surpresas que ela nos apresenta. Surpresas boas e outras nem tanto. E é sobre as "nem tão boas" que tenho me concentrado. Não que esteja em algum momento ruim, negativo ou a fim de me fazer de vítima.
É comum, num bate papo com amigos, ouvir alguém falar numa grande perda e vir com aquele discurso “sofri e dei a volta por cima". Geralmente quem "deu a volta por cima" não fala mais sobre isso.
Em muitos casos, quando uma tragédia se abate na nossa vida, a vontade é ficar em casa e nunca, mas nunquinha mesmo, sair dali. E isso adianta? Vai por mim: não adianta porra nenhuma. Mas é necessário sofrer um pouquinho, seja a sequela de um acidente, seja a perda de um amor ou até mesmo a morte de alguém querido. Passado o momento do "luto", o lance é continuar a viver. Do jeito que dá.
Se você é uma pessoa que sabe que a vida não é feita só de momentos felizes, que não entra numas de achar que a vida do vizinho é mais fácil do que a sua, você vai certamente seguir adiante, sem lamentações.
A vida é assim: leva embora um jovem saudável num acidente de carro, te sacaneia com um namorado infiel, te surpreende com uma demissão... Mas e aí? Vai ficar em casa chorando? Vai querer sair na porrada com o destino? Tudo perda de tempo.
Quem entra nessa de se revoltar não sai do lugar. Perde coisa pra caramba e nem se dá conta.
Várias vezes vi algo acontecendo com alguém e pensei "eu não aguentaria". Bobagem: a gente aguenta muito mais do que pensa. O que não dá é ficar pensando em coisas do tipo "por que comigo?". Quando olho atentamente para minha própria história de vida, vejo que também tenho meu quinhão de dor e sofrimento. E da mesma forma como recebo muito bem minhas vitórias, acho que tenho de aceitar meus tombos. E vou em frente, machucada, às vezes, mas se eu parar, passam por cima de mim.
Não me sinto nenhuma heroína por superar meus problemas. Acho isso uma bobeira danada. Não sou diferente de você, do meu amigo, da minha prima, do desconhecido que se senta ao meu lado no metrô.

Outro dia conheci um rapaz que ficou paraplégico há 4 anos, quando tinha 32 anos. Ele falou várias vezes que odeia quando o único assunto que puxam com ele é sobre as limitações: será que não dá pra conversar com uma pessoa legal, só isso? Por que a necessidade de ficar falando sobre um momento da vida dele? Ele tem vários momentos, e sua personalidade é formada por todos eles. O cara tem uma história de vida diferente da minha, mas certamente uma vida como a de todos nós: com grandes alegrias e algumas dores. Ele não é herói e achei o maior barato quando disse que não suporta quando chegam pra ele dizendo que ele vai superar, que é um guerreiro. Não! Ele não é nem quer ser. Não quer ser tratado como coitadinho assim como não quer ser modelo de nada pra ninguém. Quer ser feliz, aprendendo a viver com as limitações que a vida lhe impôs.

Essa história de "exemplo de superação" é coisa pra Globo Repórter, a vida é muito mais prática: ou você segue em frente, ou perde a sensibilidade e nunca mais aproveita a delícia que é olhar uma Lua linda no céu. 

Perder a sensibilidade das pernas é uma coisa. Devastador, de verdade, é perder a sensibilidade da alma.